Memórias e nevoeiro....

Consigo pôr-me lá… de manhã— começa o dia, a luz do sol irradia a vegetação fresca, os pássaros cantam. Os passos no caminho da terra pisam uma vez mais a estrada feita por muitos que, como eu, foram construindo aquele atalho.

Desta vez entrei pela porta de baixo. Aquela que me dá acesso aos pavilhões de bioquímica. Onde eu fiz os exames de anatomia, de fisiologia, onde passei a histologia, onde disse “vou no bom caminho”. Precisamente lá em baixo… foi onde falei com aquele que seria o meu companheiro de caminho durante uns anos, que da mesma maneira que apareceu, também desapareceu. Da mesma maneira que entrou e deixou marcas em mim, foi-se embora, sem deixar rasto. Olhos de amor e de ódio misturaram-se no primeiro e no ultimo dia. Um ciclo…que ainda hoje recordo.

O passar dos anos…não me impede recordar…não me impede reviver de novo, o ser jovem, ter 21, 22, 23 anos e percorrer cada manhã no comboio o percurso até chegar à Faculdade de Medicina. Tive uma oportunidade de ouro, aquela que mudou a minha vida. A simples curiosidade quase me tira a terra dos pés e me deixa perder a grande aposta da minha vida. 

Mas ainda estou lá. Porque não deixei de sentir. Nem consegui encobrir o enterrar de alguém na minha vida. Pensava que podia mudar o mundo, que podia mudar tudo, que era invencível…Era jovem..inocente e sem experiencia, isso sim. Mas no fundo não mudei nada. Simplesmente passei a cerca do “abrigo” e deixei-me morder. Lobos ferozes perseguiram-me de aí em diante, até clamar bem alto a ajuda de DEUS, que sempre esteve e veio em meu auxilio.

O mundo é o lugar de todos, o lugar onde idealizei ter amigos, ter pessoas com quem partilhar as minhas alegrias, as minhas conquistas. Não passava de um mero sonho. Quando entrei por aquela porta de manhã não conseguia imaginar que tudo o que criei na minha mente era apenas um bonito quadro de algo que seria inalcançável. As festas, os sorrisos, os choros, as frustrações, o saber que violava a lei….tudo isso…passou….

Posteriormente apareceu outra pessoa…não nesse caminho de flores e árvores, mas numa biblioteca. Em duas bibliotecas. Em tres bibliotecas. Frequentávamos os mesmos espaços. Frequentávamos os mesmos sitios, os mesmos lugares. tínhamos a mesma paixão pelo saber. A perfeição e a corrida contra o tempo eram os nossos maiores competidores, via uma pessoa…que eu mesma tinha sido. Mas, uma vez mais, não passava de uma miragem…estava perdida no meio do deserto e via um oásis no fundo, que sinceramente e com todas as minhas forças, pensava…..que era ele. Estava convencida da sua veracidade, da sua personalidade, da sua capacidade. Quer chovesse ou fizesse sol, não duvidava.

Estava fora do cerco outra vez. Até que o meu coração, com amplidões, restricto e bloqueado, teve que parar…com aquele passeio pelo bosque das minhas idealizações, e voltar onde devia de estar, com os pés plenos na terra, a mente no sitio, a fé, a alma, o amor por Deus e pela vida no seu devido lugar.

A batalha terminou ali. Depois de muito suplício.

O autoconhecimento produziu iluminação, e com ele, nova perspectiva, nova realidade. Mudaram-se as vontades e com ela novas qualidades… O ciclo fechou e agora foi a hora de adaptar-se à nova realidade. O tempo passou e a juventude em parte. 

Quando me ponho à espreita pela porta…encontro escadas vazias , com milhares de pegadas de jovens esperançados de um mundo melhor, um mundo que percebi que só concretizará essa melhoria quando Deus começar a reinar. 

O ciclo continua, e milhares de jovens seguirão iludidos atrás do amor, atrás da natureza, atrás das ilusões, atrás do estudo, atrás da mocidade. Como dizia Salomão…”tudo isso é vaidade”…tudo isso foi vento, apesar de carregar uma bolsa cheia de ilusões e experiencias. Quase uma vida cheia.

Assim se resume a minha vida nos últimos 7 anos da minha vida.

Não sei como teria sido dela sem ter tido o acompanhamento do Pai nela. Agora sei que lhe tenho de retribuir tudo o que ele implantou no meu coração….mas falhou. Só Ele pode o nosso caminho - seja de terra, areia, barro ou pedrinhas - ter a direcção certa e com a pessoa certa, intemporalmente!